O Verdadeiro Desafio de Gerenciar Quatro Gerações no Mesmo Ambiente de Trabalho
O mercado está experimentando quatro gerações que passaram por experiências e vivências extremamente distintas
Por Pedro Galvão*
Bem-vindos à estreia da coluna GenZ na Future Law 360° um espaço onde vamos repensar, peça por peça, os paradoxos do mundo corporativo contemporâneo.
A missão dessa coluna é ir um passo além de apontar friamente as tendências do mercado jurídico ou a visão pessoal de GenZ no corporativo. É entender os desafios que assolam a nova geração de mão de obra jurídica hoje para, enfim, pensar o futuro do Direito - ou Future Law.
O cenário atual é certamente muito curioso e, ao mesmo tempo, mais desafiador como nunca.
O mercado está experimentando quatro gerações que passaram por experiências e vivências extremamente distintas, muito graças à velocidade de mudanças que vivemos na contemporaneidade, entrando em choque cultural no mesmo ambiente de trabalho.
Neste mesmo local de trabalho, é possível encontrar quatro gerações radicalmente diferentes: Baby Boomers, X, Millennials e Z.
De maneira introdutória, é importante já categorizar algumas diferenças gerais entre esses perfis de trabalho.
Segundo o livro "Conflito de Gerações: desafios e estratégias para gerenciar quatro gerações no ambiente de trabalho", da autora Valerie M. Grubb, fica nítido como cada geração enxerga o seu modo de laborar.
Os Boomers, acostumados a hierarquias claras e carreiras lineares; a Geração X, equilibrando-se entre o analógico e o digital; os Millennials, que revolucionaram o conceito de propósito no trabalho; e, finalmente, da Geração Z, que chegam com um questionamento por padrão: "Por que não pode ser diferente?"
O discurso comum tende a reduzir os conflitos a choques superficiais que prejudicam o debate intergeracional. É comum ver na mídia tradicional pesquisas e notícias sobre o comportamento da Geração Z no mercado de trabalho, reduzindo a discussão a uma mera polêmica de audiência. Mas o verdadeiro desafio, aquele que poucas empresas e escritórios de advocacia estão realmente enfrentando, vai muito além desses estereótipos.
Isto é, como como criar uma cultura organizacional que não tente forçar uma homogeneização artificial, mas que saiba transformar diferenças em complementaridades? Como construir pontes entre gerações que pensam, agem e se comunicam de formas tão distintas, sem que nenhuma precise renunciar a sua essência?
Do porquê diversificar é melhor do que padronizar
Dentro da nossa Sociedade em Rede, conceito tão bem explorado pela sociologia contemporânea, há uma pressão invisível, porém constante, para que indivíduos e organizações se encaixem em modelos pré-fabricados de comportamento.
Sendo assim, padrões de produtividade, hierarquias rígidas, expectativas lineares de carreira são pensamentos comum no ambiente empresarial, sobretudo, jurídico. Tudo isso é vendido como "o caminho natural" do sucesso profissional que, muitas vezes, acaba em ciclos de exploração e frustração pessoal.
Entretanto, a realidade do mercado de trabalho precisa urgentemente romper com essa lógica de homogeneização forçada para um caminho eficaz de desenvolvimento organizacional.
A falsa segurança da padronização do trabalho
Muitas empresas e escritórios acreditam que padronizar processos, culturas e até mesmo perfis de colaboradores é sinônimo de eficiência. O famoso conceito "Todos na mesma página" ou "Todos alinhados" vira um mantra, mas essa prática quase fordista revela um paradoxo. Dessa forma, ao tentar eliminar diferenças, perde-se justamente o que poderia gerar inovação e resiliência.
Cabe aqui, para fins didáticos, um exemplo que elucida esse ponto controvertido:
Um escritório que exige que todos os advogados (sejam Boomers a GenZ) se comuniquem exclusivamente por e-mails formais e relatórios detalhados está, na verdade, sufocando a agilidade que os mais jovens poderiam trazer com ferramentas colaborativas em tempo real (como Slack ou Notion), assim como ignorando a expertise dos mais experientes em mediação pessoal e estratégias de longo prazo.
Em suma, a busca excessiva pela padronização pode, ironicamente, minar a eficiência que as empresas tanto almejam. Ao suprimir a diversidade de pensamentos, habilidades e formas de trabalho, perde-se oportunidades valiosas de inovação e adaptação. O equilíbrio entre estrutura e flexibilidade é essencial para aproveitar o potencial de cada geração e criar um ambiente verdadeiramente colaborativo e resiliente.
A diversidade etária como um motor de inovação
Diante de um problema do cotidiano empresarial, muitas vezes, a chave para resolver problemas complexos, como os que o Direito atual enfrenta, está na complementaridade de perspectivas. Com isso, entende-se:
- Baby Boomers e Geração X trazem experiência e uma visão estratégica acumulada por anos de prática jurídica e experiência profissional como um todo. Possuem o faro jurídico apurado, antecipam riscos e navegam por relações institucionais com fluidez.
- Millennials e Gen Z, por outro lado, operam, geralmente, com mentalidade disruptiva. Questionam processos burocráticos, propõem soluções tecnológicas, como o uso de IA, e priorizam eficiência sobre formalismos.
Nesse contexto, apesar de ser uma categorização generalista e quase estereotipada das relações etárias, quando essas visões se encontram, sem hierarquias pré-definidas sobre "quem está certo", o resultado é um ecossistema jurídico mais naturalmente ágil, criativo e adaptável.
A Cultura do "E", Não do "Ou"
Em paralelo, um dos grandes erros das organizações é cair na armadilha do falso dilema. Entende-se "Ou mantemos a tradição", "Ou abraçamos a inovação"; nesse mesmo sentido, "Ou hierarquia rígida", ou "autonomia total". Essa mentalidade binária limita o potencial das equipes multigeracionais e cria divisões artificiais que beneficiam ninguém.
O caminho mais inteligente e desafiador é abraçar a lógica do "E", em que aparentes opostos coexistem e se reforçam mutuamente.
No contexto jurídico, isso significa entender que tradição e inovação não são inimigas, mas aliadas necessárias. Um escritório pode (e deve) preservar os valores fundamentais dos pilares da tradicional prática do Direito, como rigor técnico, ética e profundidade analítica, enquanto adota ferramentas digitais que agilizem processos burocráticos.
A resistência ao "E" muitas vezes vem do medo do desconhecido. Gerações mais experientes podem temer que a inovação descaracterize seu legado, enquanto os mais jovens podem subestimar a importância da experiência acumulada. O papel da liderança é justamente mostrar como essas peças se encaixam.
Conclusão
Com base no que foi discutido anteriormente, o mundo jurídico, em que a tradição e inovação precisam coexistir, essa abordagem multigeracional se revela ainda mais crucial.
Os escritórios que entenderem que podem ser ao mesmo tempo tradicionais em sua excelência técnica e disruptivos em sua gestão, hierárquicos em sua estrutura e colaborativos em sua execução, serão os que melhor se adaptarão às demandas complexas do futuro do Direito.
A Geração Z chega não para derrubar paradigmas, mas para questionar: por que não podemos ter o melhor dos dois mundos?
Sobre a Coordenação
Pedro Galvão é estudante de Direito no Mackenzie, ele é fundador do Legalcast Mackenzie, podcast voltado a temas de inovação. Pedro também coordena a AB2L GenZ Law, frente universitária da Associação, e está à frente na liderança do Legal Hackers e do Legal Ops Lab no Mackenzie. Além disso, atua na cadeira de diretor acadêmico do Centro Acadêmico João Mendes Júnior.