Repensando os pilares de Legal Ops: Pessoas, Processos, Tecnologias....e DADOS
Por Gustavo Potrick*
A área de Legal Operations (Legal Ops) tem amadurecido exponencialmente nas últimas décadas, adotando estruturas organizacionais mais robustas e estratégicas para apoiar o desempenho jurídico e empresarial.
Tradicionalmente, os pilares fundacionais da disciplina têm sido resumidos em três grandes eixos: Pessoas, Processos e Tecnologia – eu mesmo, em meu livro Dominando Legal Ops, trabalho com esses 3 pilares, por serem componentes que fornecem uma base sólida para a construção de departamentos jurídicos mais eficientes, colaborativos e integrados com os objetivos corporativos.
No entanto, diante das transformações digitais, que levam a processos de negócio cada vez mais dinâmicos e rápidos, surge uma crescente importância na tomada de decisões cada vez mais informadas e, por outro lado, mais rápidas e mais assertivas, tornando-se imperativo repensar essa estrutura em 3 pilares: é hora de reconhecer Dados como um quarto pilar fundamental de Legal Ops.
Ao contrário do que se pode imaginar, os dados não se confundem com tecnologia.
Tecnologia é ferramenta, meio; dados são insumos e, ao mesmo tempo, produto analítico. Da mesma forma, dados não são processos — embora sua governança possa estar inserida neles — e tampouco são pessoas, ainda que a cultura data-driven dependa delas. Os dados ocupam um espaço próprio: constituem a base sobre a qual decisões são tomadas, estratégias são validadas e riscos são mitigados. Ignorar essa dimensão como pilar autônomo é negligenciar uma das transformações mais profundas e impactantes da gestão jurídica atual.
De acordo com o relatório “Data and Analytics Leadership Annual Survey” da Gartner (2024), mais de 85% dos líderes empresariais afirmaram que a análise de dados é essencial para atingir seus objetivos estratégicos. No mesmo estudo, os entrevistados indicaram que as áreas jurídicas ainda figuram entre as menos maduras em termos de uso de dados estruturados na tomada de decisão. Isso indica uma janela crítica de oportunidade — e de urgência — para que Legal Ops amplie sua capacidade de gerar valor com base em dados.
Além disso, a pesquisa “The State of Legal Operations” da ACC (Association of Corporate Counsel) destaca que os departamentos jurídicos que adotam práticas avançadas de analytics demonstram maior alinhamento com os objetivos de negócio, maior previsibilidade orçamentária e melhor alocação de recursos.
Tais benefícios não derivam exclusivamente da automação ou da reengenharia de processos, mas da habilidade de transformar dados jurídicos e corporativos em inteligência acionável. Isso reforça que a gestão de dados não pode ser tratada como subcategoria dos pilares já existentes.
O que proponho, portanto, é uma remodelagem conceitual que reconhece o valor estrutural de Dados no ecossistema de Legal Ops. A nova proposta de pilares — Pessoas, Processos, Tecnologia e Dados — não nega os modelos anteriores, mas os aprimora e os torna mais coerentes com a realidade das empresas que operam sob uma lógica data-driven.
Cada pilar continua com papel específico, mas o quarto pilar surge como elo integrador, fortalecendo a correlação entre os demais e proporcionando maior robustez à estratégia.
A adoção do pilar Dados exige novas competências.
Profissionais de Legal Ops precisarão dominar conceitos básicos de estatística, ciência de dados, modelagem preditiva, mineração de textos jurídicos e interpretação de dashboards.
Ferramentas como Power BI, Minitab, Real Statistics e softwares de machine learning deixam de ser apenas “apoios técnicos” e passam a ser instrumentos de governança jurídica.
O papel do profissional não é se tornar cientista de dados, mas sim um tradutor fluente entre o jurídico, o técnico e o estratégico.
Na prática, isso se reflete em mudanças profundas: os relatórios de status deixam de ser apenas narrativas para se tornarem análises preditivas; a priorização de demandas é baseada em evidências empíricas e não mais apenas em sensações; o desempenho contratual passa a ser medido por meio de séries temporais e indicadores históricos, e os riscos legais podem ser quantificados com maior precisão, inclusive alimentando matrizes de risco com variáveis preditoras.
A resistência inicial à inserção de dados como um pilar formal pode surgir de uma visão reducionista, que enxerga dados apenas como subproduto da tecnologia ou como extensão do trabalho analítico.
No entanto, essa visão não resiste ao avanço das tendências corporativas e regulatórias.
No contexto da inteligência artificial generativa, por exemplo, a curadoria de dados é fator determinante para resultados confiáveis. Isso reforça que a capacidade de interpretar, organizar e governar dados é, por si só, um vetor de excelência operacional.
Portanto, incorporar Dados como quarto pilar de Legal Ops não é apenas uma questão conceitual, mas uma decisão estratégica com impactos concretos em desempenho, governança, conformidade e inovação. Trata-se de equipar os departamentos jurídicos com capacidade de navegação em ambientes de alta complexidade, onde decisões precisam ser informadas, transparentes e justificáveis.
Em resumo, a reformulação dos pilares de Legal Ops é uma resposta natural à evolução do mercado jurídico e da gestão corporativa.
Adotar Pessoas, Processos, Tecnologia e Dados como fundamentos interdependentes é alinhar a operação jurídica ao que há de mais avançado em governança organizacional.
Os dados são o novo diferencial competitivo — e agora, também, o novo pilar de sustentação do Legal Operations do futuro.
Sobre a Coordenação
Gustavo Potrick é Advogado concursado da INFRAERO, desde janeiro de 2010 foi co-criador e primeiro gerente da Gerência de Operações Legais; especialista em análises de demonstrações contábeis, pela FGV; especialista green belt lean six sigma, pela FM2S, Scrum Master, pela Certiprof, professor parceiro da Future Law nos cursos de Legal Ops Management, Legal Ops e KPI’s simplificados, professor no “MBA em Controladoria Jurídica e Legal Operations”, na Radar – gestão para advogados, professor no curso de pós-graduação da PUC/PR, no curso “Legal Operations: Dados, Inteligência Artificial e Alta Performance Jurídica”; embaixador do Future Law Infinity; colunista do portal jurídico Advogados Gestores, palestrante da FENALAW 2023, palestrante da Future Law Experience 2023 e 2024, co-autor do livro “Transformação Jurídica: Criatividade É Comportamento... Inovação É Processo”, autor do livro “Dominando Legal Ops: integrando pessoas, processos e tecnologias”, membro da Comissão Nacional de Gestão e Controladoria Jurídica, da Associação Brasileira de Advogados, Coordenador da Coluna de Legal Operations na plataforma Future Law 360º e consultor independente, sobre aplicação e melhorias, das práticas e ferramentas de Legal Ops.
Legal Ops ainda vive um teatro corporativo onde todo mundo aplaude “pessoas, processos e tecnologia”… mas esquece do protagonista real: os dados que ninguém quer encarar de frente.
Esse artigo joga a real: sem dados, o discurso é bonito, mas a entrega é burocracia de luxo.
Dados não são o quarto pilar — são a lâmina afiada que corta o blá-blá-blá.
Quem ainda trata dado como pós-it analógico tá rodando inovação fake com perfume de transformação.
E aí, quantas decisões no seu jurídico são feitas com Excel emocional disfarçado de estratégia?